
No artigo anterior, vimos como todos as peças do rosário tinham sido reunidas: a Ave Maria, o Pai Nosso, as contas, o Saltério Mariano. A espada do combate espiritual estava pronta para ser confiada à primeira pessoa que iria testá-la, alguém da escolha de Maria.
No início do século XIII, as seitas albigenses estavam se espalhando e confundindo os fiéis. Seus defensores pregavam que somente o que é espiritual é bom, o corpo é mau e a alma está presa no corpo. Eram contra a encarnação.
Um padre espanhol, Domingos de Gusmão, que tinha um dom especial na oratória e na teologia, procurava defender a fé desses erros, tendo saído a pregar a verdade de cidade em cidade. Mas não estava sendo forte o suficiente para derrotar o inimigo.
Em 1208, ele se retirou para a floresta de Prouille, na França, suplicando a ajuda de Deus para os seus esforços. Após três dias de intensas orações e penitências, a Rainha do Céu veio em seu socorro. Segundo a tradição, uma bola de fogo e três anjos apareceram no céu e a Virgem falou a São Domingos, explicando-lhe que seus esforços eram nobres, mas que lhe faltava algo. A Ave Maria é que daria poder à sua pregação. Ela lhe disse:
Você tem dispendido seus esforços na terra árida, sem as gotas da graça divina. Quando Deus resolveu renovar a face da terra, Ele começou enviando a chuva fertilizadora da Saudação Angélica. Então, pregue o meu Saltério.
Esse foi o momento de fundação do rosário, em que a espada espiritual foi desembainhada.
O Saltério vinha sendo rezado há muito tempo, como já vimos no artigo anterior, mas foi a São Domingos que Maria instruiu explicitamente para pregar o Saltério Mariano. Isto é, o rosário seria um instrumento de pregação. São Domingos devia combinar a chuva fertilizante da Ave Maria com a pregação sobre os mistérios redentores de Cristo. Isso conduziria à meditação e à conversão. Essa seria a espada espiritual que ganharia os corações de volta para Cristo e venceria o inimigo.
Maria mesma apontou a São Domingos os mistérios, que combatiam diretamente os erros das heresias de então: a Encarnação, a Paixão e o triunfo glorioso do seu Filho Divino. Após o anúncio do mistério e uma pequena pregação, São Domingos rezava com o povo dez Ave Marias. E o que a palavra do pregador não conseguia, a doce oração da Ave Maria fazia pelos corações.
Leão XIII, durante da dedicação dos 15 altares do rosário na Basílica do Rosário em Lourdes, na França, em 1901, recordou a história do rosário e afirmou:
Depois que a heresia albigense tomou conta do sul da França até os Pireneus, pelas explicações e pregação de São Domingos dos maravilhosos e sagrados mistérios dos dons de Deus, a luz da verdade brilhou nos exatos lugares em que tinha sido ofuscada pela escuridão do erro. Porque isso é o que cada série dos mistérios do rosário faz por nós. A piedade, a fé e a união foram retornando à França.
Frequentemente, são Domingos desafiava os albigenses a um teste de fogo: para saber que livros continham erros de fé. Domingos e seus oponentes jogariam seus livros ao fogo. Aqueles livros que queimassem seriam os que continham erros e desagradavam a Deus. Aceito o desafio, cada vez que os albigenses atiravam suas obras ao fogo, elas eram destruídas, enquanto as de Domingos sequer eram tocadas pelas chamas.
Nossa Senhora, portanto, instruíra Domingos a levar o rosário dos mosteiros, em que seu Saltério era silenciosamente rezado, às ruas, infundindo-lhe a força dos mistérios de Cristo, o Senhor, Aquele que foi profetizado em Gn 3, 15: a descendência da mulher que feriria a cabeça da serpente. Foi o que fez o Cristo e, como um dos instrumentos depois de Sua vinda, fez e faz o rosário pregado com os mistérios de Cristo.
São Domingos fundou uma ordem mendicante e pregadora, conhecida como Dominicanos, a Ordem dos Pregadores, aprovada pelo Papa em 2016, que adotou esse método de pregação no século XIII e sempre o usou nas suas ações apostólicas dali em diante. O Saltério de Maria, precursor, tornara-se uma arma apostólica e evangelizadora usada por todos os cavaleiros espirituais da Igreja.
O saltério, portanto, já existia, como já existia a palavra rosário – rosarium -, referindo-se a buquês de rosas dados a Nossa Senhora. São Maximiliano Maria Kolbe compartilhou a história dessa maneira:
Originalmente o rosário era chamado Saltério de Maria, devido ao Saltério de Davi, composto de 150 salmos; por isso, no rosário, encontram-se 150 Ave Marias. Um noviço franciscano, em 1422, ornamentava uma imagem de Maria com rosas, no lugar onde morava. Quando entrou para o convento, não tinha mais essa possibilidade e ficou muito triste. Aflito, a Bem-Aventurada Virgem Maria apareceu a ele e lhe disse:
Recita devotamente o meu saltério e adorna-me com flores muito mais belas.
Ele começou imediatamente a recitar o rosário e viu que, para cada Ave Maria, a Virgem recebia uma rosa de fabulosa beleza, tecendo com elas uma grinalda para sua cabeça. Dos Pai Nossos, ela fez uma coroa de lírios resplendentes. Esta foi a origem no nome rosário, arrematou São Maximiliano.
A partir daí, todos os saltérios marianos passaram a ser chamados rosário, porque se compreendeu que todos os rosários são modos de coroar Maria com rosas espirituais.
Uma arma e uma rosa é o que o rosário de São Domingos sempre foi. Era o que Deus queria desde o começo, ainda que tenha levado séculos para a oração ter se tornado universalmente conhecida por rosário.
Ainda no século XIII, a Salve Rainha escrita por São Bernardo de Claraval foi acrescentada para encerrar o rosário. No século XIV, durante a peste negra, percebendo o povo que precisava do auxílio da intercessão de Maria não só para a morte, mas também naquele momento terrível, em que a morte estava vencendo, criou-se a segunda parte da Ave Maria: Santa Maria, mãe de Deus, rogai por nós, pecadores, agora e na hora de nossa morte. Amém. Foi adicionada à Ave Maria uma dimensão de urgência e súplica. Esta segunda parte se tornou normativa no século XVI.
A rosa e a arma espiritual também estão ligadas à primeira vitória do rosário durante a vida de São Domingos, na Batalha de Muret, e à vitória de Lepanto, o que veremos no próximo artigo.
Deus abençoe você!
Fonte: CALLOWAY, Donald H, MIC. Champions of the rosary. The history and heroes of a spiritual weapon.
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